Porque o orçamento de segurança da mineração NÃO é um problema
Produzido dia 1 de setembro de 2025

Escrito por Caio Leta
Porque o orçamento de segurança da mineração NÃO é um problema
No Bipa Pills de hoje, vamos conversar sobre uma grande fonte de preocupação para muitas pessoas dentro do ecossistema do Bitcoin: o orçamento de segurança da mineração de Bitcoin.
Para isso, vamos falar sobre:
- O que é o orçamento de segurança da mineração de Bitcoin
- Por que as pessoas se preocupam com o futuro do orçamento de segurança
- A adoção como solução
- O halving e o “doubling”
- Os novos incentivos da mineração de Bitcoin
- Geradores e transmissores de energia e a mineração de Bitcoin
- Produtores de petróleo e a mineração de Bitcoin
Então pegue seu café e boa leitura!
O que é o orçamento de segurança da mineração de Bitcoin?
O orçamento de segurança da mineração de Bitcoin é o valor econômico destinado a remunerar os mineradores pela proteção da rede. Este orçamento é composto pela soma de dois componentes: o subsídio de blocos (as novas moedas de Bitcoin que são emitidas em média a cada 10 minutos quando novos blocos são validados) e as taxas de transação pagas pelos usuários.
Esse orçamento funciona como um incentivo: quanto maior a recompensa, mais poder computacional é atraído para a rede, elevando o poder computacional da rede (conhecido como hashrate) e tornando ataques (como o de 51%) mais caros e inviáveis.
Com o passar do tempo, os halvings reduzem o subsídio de blocos, o que pressiona a dependência crescente das taxas para manter o orçamento. Se esse orçamento cair demais, o risco é que a segurança da rede diminua, já que mineradores poderiam pivotar totalmente o modelo de negócios e trabalhar com IA ou simplesmente entrar em falência. Tanto faz, o importante pros fins deste texto é que se este orçamento de fato for comprometido, não haverá mais incentivo econômico para os mineradores protegerem a rede Bitcoin. Assim, o orçamento de segurança é essencial para a sustentabilidade e resiliência de longo prazo do Bitcoin.
Por que o futuro do orçamento de segurança da mineração de Bitcoin preocupa algumas pessoas?
As preocupações em torno do futuro do orçamento de segurança da mineração de Bitcoin estão ligadas ao desenho econômico da rede e à sua sustentabilidade no longo prazo.
O problema é que o subsídio de blocos sofre reduções periódicas a cada halving (aproximadamente a cada quatro anos). Isso significa que, no longo prazo, a principal fonte de receita dos mineradores deverá migrar do subsídio para as taxas de transação. Se essas taxas não forem suficientes para compensar a perda de emissão, o orçamento de segurança pode cair, diminuindo o incentivo econômico para mineradores permanecerem na rede.
Críticos temem que, em um cenário de baixo orçamento, o hashrate seja reduzido a ponto de tornar a rede vulnerável a ataques de 51%, comprometendo a confiança no sistema. Em resumo, a preocupação é um debate sobre equilíbrio econômico e segurança: se o Bitcoin conseguirá, no futuro, atrair recursos suficientes via taxas para sustentar o mesmo nível de proteção robusta que hoje é garantido pelo subsídio de blocos.
A adoção ampla do Bitcoin pode solucionar essa questão?
Muitos dentro do ecossistema acreditam que a solução para o desafio do orçamento de segurança do Bitcoin virá naturalmente com a adoção crescente e o aumento da demanda pela rede. À medida que mais pessoas e empresas utilizam o Bitcoin, cresce a competição pelo espaço limitado em cada bloco, elevando as taxas de transação. Isso cria uma fonte de receita sustentável para os mineradores, capaz de substituir gradualmente o subsídio de blocos, que tende a zero com os halvings.
Dois exemplos recentes reforçam essa visão: as inscrições e as runas, que introduziram novas formas de uso da blockchain do Bitcoin e com isso geraram mais demanda pelo espaço no bloco. Durante seus períodos de maior popularidade, as taxas de transação chegaram a superar, em várias ocasiões, o próprio subsídio do bloco. Para muitos, esses episódios mostram que, em um cenário de ampla adoção global, a rede pode gerar receitas suficientes apenas com taxas, garantindo a segurança de longo prazo sem depender da emissão de novas moedas de Bitcoin.
Os céticos argumentam que confiar apenas na adoção e aumento das taxas como solução para o orçamento de segurança é arriscado. Eles apontam que a demanda por transações no Bitcoin pode ser instável e dependente de modas passageiras, como vimos com inscriptions e runes. Além disso, defendem que taxas muito altas podem afastar usuários comuns, limitando a utilidade da rede. Assim, questionam se haverá fluxo consistente e previsível de taxas capaz de sustentar a segurança no longo prazo.
O halving e o “doubling”
O halving é um dos pilares fundamentais da economia do Bitcoin. A cada aproximadamente quatro anos, o subsídio de blocos é cortado pela metade. Esse mecanismo garante a escassez programada da moeda, mas também levanta dúvidas sobre a sustentabilidade do orçamento de segurança da rede no longo prazo.
Na prática, se antes do halving os mineradores recebiam 6,25 BTC por bloco, após o evento passam a receber apenas 3,125 BTC, além das taxas de transação. Isso significa que, em termos de unidades de bitcoin, sua receita cai instantaneamente 50%. Para que esse corte não afete sua rentabilidade em dólares, o preço do Bitcoin precisaria dobrar no ciclo seguinte, compensando a perda.
Até hoje, foi isso que aconteceu. Historicamente, o preço do Bitcoin mais do que dobrou após cada halving, o que fez com que, em média, os mineradores passassem a ganhar mais dólares por bloco em cada novo ciclo, e não menos. Esse efeito tem sustentado um alto orçamento de segurança, atraindo novos mineradores e mantendo o hashrate em expansão.
O problema surge se a tese de que o Bitcoin apresentará retornos decrescentes a cada ciclo, o que vem ocorrendo, se confirmar no longo prazo. À medida que o ativo amadurece e sua capitalização de mercado cresce, pode se tornar cada vez mais difícil dobrar de valor em tão pouco tempo. Se isso ocorrer, o subsídio cortado não seria integralmente compensado pela valorização do preço.
Nesse cenário, o orçamento de segurança em dólares poderia começar a cair, reduzindo os incentivos econômicos para a mineração. Contar com o doubling do preço do Bitcoin é contar com a sorte, algo que nós bitcoiners não gostamos de fazer.
Então a pergunta que se impõe é: existem outras questões que me fazem considerar que o orçamento de segurança da mineração estará seguro no futuro ou eu só estou contando com a sorte ao considerar que a adoção e o doubling resolverão esse problema?
E a resposta é "não". Eu acredito que essa questão do orçamento de segurança da mineração é um não problema por já ter trabalhado com mineração e entender para onde os macrotendências levarão esta indústria no espaço de uma ou duas décadas.
Os novos incentivos da mineração de Bitcoin
Os incentivos da mineração de Bitcoin estão em transformação. No passado e ainda hoje, a dinâmica econômica da mineração se assemelha muito à de startups: empresas precisam levantar capital de curto prazo, montar operações rapidamente e gerar retorno significativo para investidores em poucos anos, já que a competição e os halvings comprimem margens de lucro. Esse modelo cria forte pressão para buscar eficiência imediata e crescimento acelerado.
No entanto, a tendência de longo prazo aponta para uma mudança profunda: a atividade tende a se integrar cada vez mais às indústrias de energia e petróleo. Nesse contexto, mineradores deixam de operar como startups de tecnologia e passam a funcionar como parte da infraestrutura energética global, monetizando excedentes de eletricidade ou aproveitando gás natural que seria desperdiçado.
Vale ressaltar que, em contraste com o atual estado da mineração, empresas do setor de energia ou de petróleo costumam realizar investimentos com horizontes de longo prazo, podendo esperar décadas até que esses projetos comecem a gerar retorno financeiro consistente. Essa transição muda radicalmente os incentivos, privilegiando estabilidade, eficiência e visão de décadas.
Setor de energia e a mineração de Bitcoin
A mineração de Bitcoin é a primeira tecnologia criada pela humanidade que permite monetizar energia ociosa de forma global e instantânea. Isso acontece porque a mineração de Bitcoin transforma eletricidade em poder computacional que, por sua vez, é convertido em Bitcoin, um ativo líquido negociado em qualquer mercado. Dessa forma, mesmo energia que seria desperdiçada, seja por excesso de produção renovável ou por limitações de transmissão, pode ser convertida em receita imediata.
Esse potencial vem sendo explorado por grandes empresas de energia, como a Duke Energy, uma das maiores concessionárias dos Estados Unidos, com milhões de clientes em vários estados, e a Tokyo Electric Power Company (Tepco), principal fornecedora de eletricidade do Japão, responsável por abastecer Tóquio e região. Ambas enxergam na mineração não apenas uma atividade financeira, mas também uma ferramenta estratégica para otimização de suas operações.
Um dos casos mais promissores está no uso da mineração para equilibrar cargas nas redes elétricas (curtailment). No Texas, por exemplo, mineradores já atuam como consumidores flexíveis: desligam suas máquinas em momentos de pico de demanda, liberando energia para residências e indústrias, e religam quando há excesso de oferta, especialmente de fontes renováveis. Esse arranjo garante maior estabilidade ao sistema e novas fontes de receita para as geradoras.
A integração entre mineração e redes elétricas tende a evoluir rapidamente. Ao funcionar como um consumidor ajustável em tempo real, a mineração pode viabilizar a expansão de energias renováveis, monetizar excedentes estruturais e redefinir os incentivos das indústrias de energia e petróleo. No longo prazo, essa convergência pode transformar a mineração de Bitcoin em parte fundamental da infraestrutura energética global.
Ou seja, quando o setor de energia utiliza a mineração de Bitcoin para monetizar energia ociosa, o cálculo econômico muda completamente em relação ao dos mineradores tradicionais. Enquanto empresas de mineração buscam altos retornos imediatos, as companhias elétricas estão aproveitando um recurso que seria descartado. Isso significa que podem operar com margens menores e horizontes de retorno muito mais longos, tornando a mineração um complemento estratégico às suas operações, em vez de um negócio independente que depende exclusivamente da alta do Bitcoin.
Setor do petróleo e a mineração de Bitcoin
Na indústria do petróleo, o potencial de monetização de energia ociosa é particularmente relevante. A extração de petróleo frequentemente libera metano, um gás associado aos reservatórios de hidrocarbonetos. Como nem sempre existe infraestrutura para capturar, transportar ou utilizar esse gás, as empresas recorrem à queima em flares (flare gas em inglês), prática que converte o metano (CH4) em dióxido de carbono (CO2), mas ainda assim representa desperdício de energia. É justamente aí que a mineração de Bitcoin entra como solução para transformar essa energia antes desperdiçada em valor econômico.
Grandes companhias já exploram essa possibilidade. A ExxonMobil, uma das maiores petrolíferas do mundo, e a ConocoPhillips, gigante americana do setor, iniciaram projetos para direcionar o metano excedente de suas operações para geração de energia elétrica usada em mineração de Bitcoin. Essa abordagem reduz emissões poluentes, cria uma nova fonte de receita e melhora a eficiência do uso dos recursos naturais. Até mesmo a Petrobrás já começou a estudar o assunto.
No futuro, a integração entre mineração de Bitcoin e petróleo pode transformar um passivo ambiental em um ativo estratégico, redefinindo incentivos do setor. O que antes era energia perdida passa a ser monetizado, mostrando como a mineração pode se tornar peça fundamental também na transição energética e na gestão sustentável da indústria petrolífera.
A interface entre a mineração de Bitcoin e a geopolítica
Vale lembrar da interface geopolítica envolvida nesse racional: a Gazprom, gigante estatal russa do setor de energia e uma das maiores produtoras de gás natural do mundo, tem explorado a mineração de Bitcoin como forma de aproveitar recursos energéticos ociosos. Após a explosão do gasoduto Nordstream 2, o que não falta para a Rússia é energia ociosa na forma de gás natural.
Esse movimento reflete tanto a busca por novas fontes de receita em meio às sanções internacionais, quanto o interesse estratégico da Rússia em reduzir sua dependência do sistema financeiro global tradicional, utilizando o Bitcoin como alternativa geopolítica ao sistema SWIFT e instrumento de monetização energética.
Um adendo de como a mineração de Bitcoin ajuda a combater as mudanças climáticas
A queima do metano (CH₄) é considerada positiva para o meio ambiente porque esse gás tem um potencial de efeito estufa cerca de 80 vezes maior que o do dióxido de carbono (CO₂) em um horizonte de 20 anos. Ao queimá-lo, o metano é convertido em dióxido de carbono e água, reduzindo significativamente seu impacto climático. A reação química é:
CH4+2O2→CO2+2H2OCH₄ + 2 O₂ → CO₂ + 2 H₂O
O processo gera dióxido de carbono, vapor d’água e calor. Porém, na queima do metano a céu aberto (flare gas), a combustão é frequentemente incompleta, permitindo que parte do metano escape diretamente para a atmosfera. Já quando o metano é queimado em sistemas fechados, como na geração de energia elétrica, incluindo usos como a mineração de Bitcoin, a combustão é completa, evitando a liberação residual de metano. Dessa forma, o aproveitamento energético é duplamente benéfico: reduz emissões e cria valor econômico.
Em síntese
A discussão sobre o orçamento de segurança da mineração de Bitcoin costuma gerar apreensão, especialmente quando se observa a redução periódica do subsídio de blocos provocada pelos halvings. O argumento mais comum dos críticos é que, à medida que o subsídio caminha para zero, a rede dependerá cada vez mais das taxas de transação, e que essas taxas podem não ser suficientes para sustentar a segurança no longo prazo.
No entanto, essa visão ignora a evolução natural da mineração e sua integração crescente com setores estratégicos da economia global. Como vimos acima, a mineração de Bitcoin está se transformando em uma peça importante da infraestrutura energética mundial.
No setor elétrico, mineradores já atuam como consumidores flexíveis, ajudando a equilibrar redes e monetizar energia ociosa. No setor de petróleo, a atividade começa a capturar e aproveitar metano que antes seria queimado sem utilidade. Esses exemplos mostram que a mineração está deixando de ser dependente apenas do preço do Bitcoin e passando a ser um instrumento de eficiência energética e ambiental.
Assim, a preocupação com o orçamento de segurança só persiste entre aqueles que não compreendem essa trajetória. No futuro, a mineração estará tão incorporada às indústrias de energia que a segurança do Bitcoin será consequência natural desse alinhamento econômico.
Então não se preocupe com essa história de orçamento de segurança da mineração de Bitcoin pois isso é um não problema e siga poupando em Bitcoin.
Por essa semana é só, bom final de semana e até o próximo Bipa Pills
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