Dessa vez é diferente?

Produzido dia 23 de junho de 2025

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No Bipa Pills de hoje, vamos discutir como a estrutura do mercado mudou neste ciclo devido a institucionalização do Bitcoin, o que isso significa para o seu preço e para a trajetória de crescimento do ativo no longo prazo.

Para isso, vamos falar de:

  • O impacto da aprovação dos ETFs e do aumento da regulação pós-FTX
  • Como este ciclo vem sendo diferente dos ciclos passados
  • Como essa nova estrutura se manifesta nos indicadores de mercado
  • Como até as quedas estão diferentes
  • O que isso significa para o longo prazo do Bitcoin

Então pegue seu café e boa leitura!

O aumento da regulação pós-FTX e o impacto dos ETFs de Bitcoin

O colapso da FTX foi um dos eventos mais impactantes da história recente do mercado cripto. Ao revelar um esquema massivo de fraude e má gestão, o episódio gerou uma onda de desconfiança e atraiu intenso escrutínio regulatório sobre todo o setor. Reguladores ao redor do mundo passaram a olhar com mais atenção para as exchanges, tokens e empresas que operam com pouca transparência ou controle.

Nesse contexto, a diferença fundamental entre o Bitcoin e o restante do ecossistema ficou mais evidente. Enquanto muitas criptomoedas dependem de estruturas centralizadas e figuras de autoridade (aqui podemos citar Vitalik Buterin no Ethereum e o Sam Bankman-Fried na FTX, dentre vários outros), o Bitcoin permanece como uma rede descentralizada, imutável e transparente, sem líderes ou entidades de controle.

Para investidores do mercado tradicional e instituições, essa distinção se tornou um critério essencial na hora de avaliar riscos e alocar capital.

A proposta de um ETF de Bitcoin pela BlackRock, em junho de 2023, seguida pela aprovação de diversos ETFs spot pela SEC em janeiro de 2024, representou um divisor de águas para o mercado. Mais do que simplesmente abrir as portas para novos fluxos de capital, esses movimentos marcaram uma distinção clara entre o Bitcoin e as demais criptomoedas.

O fato de a maior gestora de ativos do mundo ter escolhido o Bitcoin como objeto de seu primeiro ETF no setor é altamente simbólico e marca ainda mais essa distinção entre o Bitcoin e as demais criptomoedas.

Para as instituições, a aprovação dos ETFs sinalizou que o Bitcoin agora está inserido de forma legítima no sistema financeiro tradicional. Isso reduziu barreiras regulatórias e operacionais, permitindo que fundos, gestores e investidores institucionais finalmente tivessem acesso fácil e seguro ao ativo.

Com isso, a estrutura do mercado mudou. O que significa que os movimentos do mercado mudaram e estão diferentes dos ciclos passados.

As diferenças deste ciclo para os ciclos anteriores

Neste ciclo, as movimentações do preço do Bitcoin estão menos explosivas, porém mais consistentes e sustentadas, em contraste com os ciclos anteriores marcados por euforia e quedas abruptas. A pressão vendedora diminuiu, e os movimentos parecem guiados por fundamentos mais sólidos, refletindo uma base de investidores mais paciente, experiente e alinhada com uma tese de longo prazo, e não com alavancagem, como vimos nos ciclos anteriores onde cascatas de liquidação eram comuns.

A imagem apresentada abaixo ilustra a mudança estrutural que ocorreu com o comportamento do preço do Bitcoin neste ciclo em comparação aos ciclos anteriores.

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Nas três grandes altas anteriores (2013, 2017 e 2021), o gráfico mostra curvas acentuadas impulsionadas pelo FOMO do varejo, ou seja, movimentos de euforia descontrolada por parte dos investidores pessoa física. Esses ciclos foram marcados por uma rápida expansão de preço, seguidos por quedas abruptas e profundas correções, características clássicas de mercados dominados por sentimento e especulação.

A partir de 2023, o padrão muda: em vez de uma curva exponencial, o gráfico mostra uma canal de alta mais suave e estruturado. Isso sugere uma nova fase de maturidade, na qual a demanda é mais organizada e previsível, impulsionada por instituições financeiras que alocam capital de forma gradual, estratégica e com visão de longo prazo, e não cedendo ao FOMO e à euforia de curto prazo.

Essa transição, evidenciada no gráfico, reforça a tese de que o Bitcoin está se transformando em uma classe de ativo institucional. É uma mudança profunda no perfil do investidor predominante e nos mecanismos de formação de preço — cada vez menos influenciados por ciclos emocionais e mais por fundamentos e fluxo de capital programado.

Como essa nova estrutura se manifesta nos indicadores de mercado?

Múltiplo de Mayer

A imagem abaixo mostra a análise do Z-Score do Múltiplo de Mayer, uma métrica que mede o quanto o preço atual do Bitcoin está acima ou abaixo da sua média móvel de 200 dias (200DMA), ajustado pela volatilidade histórica (Z-Score). Essa ferramenta ajuda a identificar zonas de euforia e pessimismo.

Multiplo de Mayer Score.png Fonte: Check Onchain

Nos ciclos anteriores, o Mayer Multiple Z-Score frequentemente ultrapassava os patamares de +1,5 a +2 desvios padrão (linhas rosa e laranja tracejadas), sinalizando momentos de FOMO e euforia — principalmente dominados por investidores de varejo. Esses picos precederam os topos de mercado nos ciclos de 2013, 2017 e 2021.

No ciclo atual, porém, o comportamento é visivelmente diferente: O Z-Score não atingiu níveis extremos em nenhum momento, mesmo com o preço do Bitcoin já ultrapassando os US$100 mil.

Isso é coerente com a leitura de que o mercado mudou e se institucionalizou e agora ocorre menos euforia, menos alavancagem e mais racionalidade no comportamento dos investidores.

A ausência de picos no Z-Score reforça a tese de que estamos diante de um ciclo estruturalmente diferente, com entrada gradual de capital institucional e menos influência de sentimentos irracionais de mercado. Isso pode indicar maior sustentabilidade nos movimentos de preço, mas também indica ciclos menos explosivos no curto prazo, com topos menos elevados.

Indicador MVRV de Holders de Curto Prazo

MVRV.png Fonte: Check Onchain

A imagem acima apresenta o Indicador MVRV de Holders de Curto Prazo (STH-MVRV), uma métrica on-chain que compara o valor de mercado das moedas detidas por holders de curto prazo com o seu valor realizado (preço médio de aquisição). O gráfico divide esse comportamento entre períodos de lucro (“STH-MVRV in Profit”, linha laranja) e de prejuízo (“STH-MVRV in Loss”, linha azul), além de incluir as bandas de desvio padrão (+1, +1.5 e -1, -1.5).

Nos ciclos anteriores, o STH-MVRV atingia valores extremos, frequentemente ultrapassando a linha de +1.5 desvio padrão (rosa tracejada), refletindo picos de euforia e especulação, característicos de um mercado dominado pelo varejo.

No ciclo atual, a métrica mostra um comportamento mais contido: o STH-MVRV atinge lucros, mas não explode para níveis históricos, indicando que há menos exuberância especulativa no mercado.

Essa estabilidade no MVRV reforça o cenário de um ciclo com fluxos estruturados e disciplinados, provavelmente influenciado pela entrada de investidores institucionais com estratégias de alocação e rebalanceamento mais cautelosas.

O comportamento dos holders de curto prazo, antes impulsivo, agora parece mais racional e alinhado a fundamentos. Isso é consistente com a tese de maturação do mercado do Bitcoin como ativo institucional.

Osciladores Extremos dos Ciclos do Bitcoin

A imagem abaixo mostra o gráfico dos Osciladores Extremos dos Ciclos do Bitcoin, um modelo que agrega diferentes indicadores on-chain para identificar picos e fundos cíclicos no preço do Bitcoin. Entre os indicadores considerados estão: MVRV (valor de mercado/valor realizado), SOPR (lucros realizados em transações), Multiplo de Puell (receita dos mineradores), Reserve Risk (relação risco/recompensa do holder) além de que a soma das condições (linha preta) atua como um agregador dos sinais extremos.

somatória de indicadores.png Fonte: Check Onchain

Nos ciclos anteriores, é evidente como esses indicadores se alinham em regiões de pico (faixas laranjas, sinal de topo > 0.85) e fundo (faixas azuis, sinal de fundo < -0.70), sempre com forte reação no preço. Isso reflete um comportamento de manada, típico de ciclos dominados pelas emoções do investidor de varejo.

No ciclo atual, porém, a soma das condições (linha preta) ainda não atingiu os níveis históricos extremos de topo, mesmo após a valorização relevante que o Bitcoin passou neste ciclo de alta, quando ele saiu dos US$16 mil para ultrapassar os US$100 mil. O conjunto de métricas segue ativo, mas menos sincronizado e menos extremo.

Isso reforça a ideia de que estamos num novo tipo de ciclo, com fluxo de capital mais disciplinado e progressivo, guiado por estratégias institucionais estruturadas. A ausência de histeria coletiva sugere que ainda não atingimos o topo do ciclo, e que a dinâmica atual é mais madura e sustentável do que nos ciclos anteriores.

As quedas desse ciclo em comparação com os ciclos anteriores

A imagem abaixo mostra o gráfico de correções de preço durante os ciclos de alta do Bitcoin, segmentado por cores para cada ciclo, com destaque para as quedas a partir dos topos locais.

correções em ciclos de alta do Bitcoin.png Fonte: Check Onchain

Observando o ciclo atual (em roxo, 2022+), fica evidente que as correções de preço estão significativamente mais suaves do que nos ciclos anteriores. Em ciclos como 2011–2015 (vermelho), 2015–2017 (azul) e 2018-2021 (verde), quedas acima de 30%, 40% ou até 60% eram comuns durante a própria tendência de alta. Já no ciclo atual, mesmo com a valorização expressiva, as quedas têm se mantido em grande parte abaixo de 20% na maioria dos movimentos, com muito menos incidência de picos de volatilidade negativa.

Esse comportamento é coerente com a tese de institucionalização do Bitcoin. Com a entrada de capital mais disciplinado, como ETFs e fundos institucionais, a formação de preço se tornou mais estável, com menor influência de alavancagem ou pânico do varejo. A imagem reforça visualmente que o mercado está mais maduro, com menor propensão a correções violentas dentro de ciclos de alta.

O que essa tendência pode significar para o longo prazo

O gráfico abaixo mostra com clareza o impacto do lançamento do ETF de ouro GLD em novembro de 2004 sobre o preço do metal. Logo após a criação do ETF, o ouro passou por um movimento de alta consistente de sete anos, com valorização de cerca de 359% até seu topo em 2011.

GLD.png Variação do preço do ouro entre 2000 e 2023. Fonte: TradingView

Essa valorização não foi fruto de euforia especulativa de curto prazo, mas de um fluxo contínuo de capital, resultado da demanda estrutural criada pelos ETFs. O lançamento do GLD permitiu que investidores institucionais e pessoas físicas acessassem o ouro com facilidade, sem necessidade de armazenamento físico ou custos logísticos.

Ao transformar o ouro em um ativo com a mesma facilidade de negociação de uma ação, o ETF aumentou a base de compradores potenciais e, com isso, gerou um fluxo de compras estável e crescente. Isso elevou o preço do ativo de forma mais gradual, previsível e institucionalizada, algo análogo ao que está sendo observado com o Bitcoin após a aprovação dos ETFs spot em 2024.

A lição aqui é clara: quando um ativo escasso ganha acessibilidade e legitimidade institucional, a pressão compradora tende a ser duradoura e transformacional.

Em outras palavras, o Bitcoin mudou. O mercado do Bitcoin passou por uma profunda transformação nos últimos anos, tornando-se cada vez mais institucionalizado. Com a entrada de fundos, ETFs e investidores profissionais, o perfil dos participantes mudou, impactando diretamente a dinâmica de preço.

Os padrões de ciclos anteriores, marcados por fortes altas impulsivas seguidas de correções abruptas, estão dando lugar a movimentos mais estáveis e estruturados. As altas extremas de preço estão menos frequentes, mas também há uma notável redução na intensidade das quedas.

Esse novo comportamento reflete uma base de demanda mais sólida, previsível e resiliente, típica de um mercado em processo de maturação. O processo de entrada de capital institucional no Bitcoin está apenas começando.

A aprovação dos ETFs americanos abriu as portas para uma nova classe de investidores que, até então, estavam à margem do ecossistema. Comparando com o ETF de ouro (GLD), que atraiu fluxo contínuo por pelo menos sete anos após seu lançamento, é razoável projetar que o Bitcoin também poderá viver um período prolongado de demanda institucional. Isso sugere que o atual ciclo pode ser mais longo e sustentado do que os anteriores, marcados por explosões rápidas seguidas de correções profundas. O fluxo institucional tende a ser gradual, estratégico e duradouro.

Por essa semana é só, bom final de semana e até o próximo Bipa Pills


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